29.11.09

Não há maior liberdade que não pensar

Senhores, o poema
está aqui
e talvez não seja
pura comunicação; talvez
eu não pense
nele e em tudo o que
eu diga não haja
mais que um silêncio; talvez eu
não seja o gênio que todos
esperem em um grande
poeta, e talvez mesmo
que eu não seja um gênio
e que meu poema seja
pobre e triste como
as velhas
hipocondríacas
(que procuram e
não acham, que procuram
e não acham, que
procuram até achar), talvez
mesmo assim o poema
não esconda
nada por trás
de sua forma opaca.

Eu não estou aqui
para fazer metalinguagem,
porque essas coisas são coisas
de quem não sabe o que fala. São coisas
de quem só quer fazer o poema
porque acredita no
poema, e acredita que
ele seja importante, e quer
que ele seja; mas ele
não é. E eu, que aqui
não passo de um par de mãos
e um pau cansado,
um corpo ameaçado
pelos vapores obscuros do verão e
pela hérpes que me mastiga
as genitálias, talvez eu,
esse corpo, esse homem vencido,
não tenha nada para
dizer, e talvez isso seja
justamente aquilo que
encravado em sua
carne (o silêncio,
as sombras, o mundo
que não foi e que
poderia ter sido e que
mesmo assim não
foi) é mesmo
a sua única
e plena
liberdade.