25.1.09

O caçador de fezes

O caçador de fezes manteve-se em cima do mastro, à procura de sua presa. Pegou seu fuzil e deu um tiro para o alto, enquanto os pedacinhos de merda corriam desesperados e chorões de um lado para o outro. Eles sabiam que, a qualquer momento, poderiam ser esmagados pelos pés daquele que os olhava atentamente, com um sorriso mórbido no canto da boca. A multidão de bosta ficou o dia todo apavorada pensando quem seria o próximo, o que poderia acontecer.

Então o gigante desceu de seu mastro, apontou a arma para um deles e todos os que estavam em volta fecharam os olhos e inclinaram a cabeça. Ao apertar o gatilho, uma bala de festim atingiu o coração de toda a multidão.

- Você deu sorte hoje...

Era sempre assim, todas as tardes. Nunca chegou a realmente estourar os miolos de alguém. Diziam que ele vinha de outros lugares, onde fazia o mesmo com os dejetos inocentes das vizinhanças. Não se sabia seu nome, nem seu paradeiro, apenas o cheiro do seu hálito e a expressão aterrorizante de quem não se importa com merda alguma. Ainda que alguns pensassem que ele não seria capaz de fazer tudo aquilo que insinuava, ninguém se arriscava a desafiá-lo.

Quando ele se foi rindo, para bem longe, já era noite, e a multidão continuou assustada, olhando pelas sombras dos arbustos, sempre esperando pelo pior com os molhados olhos atentos e as calças borradas.

Um dia qualquer - eu me lembro, estava chovendo! - ele chegou com sua pistola, encostou-a na cabeça do primeiro pedaço marrom que encontrou e apertou o gatilho sem a menor justificativa. A multidão petrificou-se. Em meio ao silêncio constrangedor do Coliseu, ele caminhou rindo um riso sinistro, que não se sabe bem se era humano ou de algum ser menos higiênico... no fundo, todos sabiam que, fora dali, no reino dos homens cheirosos, ele era apenas como nós, mais um pedaço de gente esmagado pela estranha agonia das brisas geladas da manhã.