19.8.11

Que a solidão me diga
onde ir, quem
liga
que a morte
venha, quando
os dias
passam e o rastro dos
mortos aflita-se em teu
peito.

Tenho preguiça
de pensar.

Tenho preguiça.

Mas o mundo em minhas mãos
tem formas que
desconheço.

Que me diz o pinheiro distante
que em sua firmeza
desafia o concreto
dos prédios mais altos?

Meu dedo cortado,
em frente à noite densa
ao uivo do gato
às garras caninas
ao lobo dos olhos
ao globo do mundo

SOU FUNDO
como um apocalipse
cuja promessa
é o amanhã.

SOU LUZ
que quando amanhece
esvanece sem vida.

SOU TUDO
que dança
na madrugada
e lhe desafia.



A solidão de Deus me olhando nos olhos.



Eu tenho a morte
como quem tem
um filho.

2.8.11

Deus é a palavra
que em sua tessitura
contempla toda a estranheza do mundo.

Deus é isso.

Onde se diz coisa, se diz Deus.
Onde se diz homen, se diz Deus.
Onde se diz nuvem, se diz Deus.
Onde os moinhos moem, se diz Deus.
Onde o poema nasce, se diz Deus.

Onde meus pés se cansam, se diz Deus.
Onde nadam os girinos, se diz Deus.
Onde seu pai te olha, se diz Deus.
Onde seu pai chora, se diz Deus.
Onde seu irmão te ignora, se diz Deus.
Onde a noite termina, se diz Deus.
Onde há sopa quente te esperando, se diz Deus.
Onde há o silêncio, se diz Deus.
Onde os gatos fogem, se diz Deus.
Onde não se diz nada, se diz Deus.

Deus é isso
Deus é aquilo.
Deus são as coisas.
Deus é linguagem.
Deus é o Ser das coisas em um mundo sem coisas e sem Ser.

Deus só não é o não-ser,
que ele é a prova
de que ele mesmo é Ser
em sua presença triste e incontestatável.

Porque haveria prova mais verdadeira e feliz de que Deus existe
do que olhar para fora da janela
e saber que ali onde não há nada, toda a solidão do mundo se esconde?
Um dia estarei morto.

Um dia estarei morto.



Um dia estarei morto.


Morto

Não é difícil de entender.

Um dia a morte vem

Um dia ela me pega.

Você vai morrer comigo




Um dia estarei morto.





A morte virá
e colocará seus pés sobre minha mesa de centro
e dirá com o dedo em minha cara:
"um dia eu tinha que chegar"

SEJA BEM VINDA
dorme aqui comigo,

abraça-me,

para onde vamos hoje

QUE LUGAR É A MORTE?




Um dia eu vou morrer.

Segura em minha mão, vem comigo,
quero viver contigo...
quero dizer o que nunca te disseram
quero comer teus dedos e chupar os ossinhos
quero voar sobre os prédios e escalar as escamas de concreto que os encarapaçam
quero ver as nuvens vermelhas na noite densa e úmida
quero ouvir o sussuro dos motores dos carros
seus fluidos queimando
o cheiro do CÉU
quero pôr minha língua nas nuvens,
quero fechar os olhos por uma noite sem pensar com imagens
quero me enfiar no cu de Deus e subir por suas entranhas
e agarrar seu coração


E COMO EU PODERIA NÃO TER MEDO DA MORTE?
E COMO EU PODERIA DIZER "ESTOU TRANQUILO!?"
E COMO NÃO OLHAR PARA FORA E SENTIR O VENTO BATENDO EM SUAS BOCHECHAS ROSADAS, INUNDANDO SEUS PULMÕES DE AR E SEU SANGUE DE FUNGOS SEM SE PERGUNTAR

ONDE VAMOS AMANHÃ?

Quantos dias mais, pai, você vai se perguntar
o que eu fiz
da minha vida?

Quantos dias mais, pai, você vai me perguntar
o que eu fiz
da minha vida?

Quantas vezes mais, pai, vou olhar nos teus olhos cheios de inocência
e dizer "não sei para onde ir?"

Quantos dias mais, pai, o sono vai bater em minha porta me lembrando que perco tempo com poemas noturnos, palavras negras, ESQUIZOVERBORRAGIAS?

E se eu mascasse Deus em minha boca?

E se eu mastigasse meus intestinos antes de sair?

E se eu me mudasse para bem longe, sem ter de acordar e ouvir as pessoas vivendo à minha volta?

Quantas vezes mais vou me sentir um fantasma
antes mesmo
da morte chegar?

Quantos dias santos perderei
antes que a vida
me profane com suas sombras?